quinta-feira, 31 de julho de 2014

Guerras do dia-a-dia


     As vezes eu sonho com a minha infância, época em que eu jogava bola na rua até meia-noite, então exausto de tanta correria me sentava na calçada com meus colegas olhando o céu azulado com pequenos pontos cintilantes até que alguém sugerisse uma nova brincadeira, na maioria das vezes pulávamos corda ou quando a disposição era imensa fazíamos o meu favorito: esconde-esconde. Voltar para casa era a penúltima coisa a se pensar, a última talvez fosse dormir.

Meus pais nunca se preocuparam com minha segurança e olha que vivíamos em uma vila na periferia da cidade. Em que épocas de calor excessivo a regra era dormir de janelas abertas, já no frio extremo ficávamos todos reunidos em uma única cama bem unidos, o conforto daquelas noites frias são hoje fruto de sorrisos amistosos e olhares que imploram para que possamos voltar e reviver aquilo novamente.

Em algum ponto da história eu perdi tudo isso, por mais que eu me esforce não consigo detectar o fator decisivo para uma mudança tão drástica no cotidiano, ainda não voltamos para a ditadura, pelo menos é o que dizem as más línguas. Muros altos, grades eletrocutadas, alarmes, câmeras sensíveis a calor, cães de guarda, segurança privada armada, segurança pública armada, segurança, armada e eu aqui listando o kit básico de segurança do meu bairro atual.

Me pergunto o motivo de tanta precaução, algo de muito valor deve estar sendo guardado dentro dessas fortalezas, pena que eu só consigo ver valores sendo perdidos. 

Estamos em um ponto em que incitamos o perigo potencial dos nossos semelhantes a nós. Vivemos em uma sociedade que aposta contra ela própria, estamos esperando que alguém venha e tente pular nossos muros e roubar nossos bens, aguardamos pacientes ao lado da janela o agudo e interminável som do alarme do carro que entrega vergonhosamente qualquer garoto que acabe de atingi-lo com sua nova bola.

Já ouvi dizer que é necessário o Mal para coexistir o Bem, mas eu nunca compreendi muito bem o significado profundo e brilhante que levam as pessoas a fazerem essa citação com orgulho e convicção. Criamos descaradamente o mal na nossa sociedade e logo em seguida o culpamos, o investigamos, o julgamos e por consequência o condenamos por atos que sem dúvida não partiram exclusivamente dele.

Olho para tudo isso e não vejo esperanças, eu devo estar no meio do túnel e este por sua vez deve ser imenso, mas eu acredito que não seriamos sádicos o suficiente para criar um túnel sem saída, a luz deve estar lá nos esperando. 

Eu passei a ter medo, mas não foi da vida e sim do que estão fazendo com ela.


Imagine....

     Em um letreiro na Avenida Principal havia uma mensagem muito subliminar e bem simples, a cada dia a mensagem mudava e o seu significado também. Nesse letreiro estava estampado para toda a sociedade a quantidade de impostos que ela pagava a cada segundo e aqueles números cresciam, iam se tornando cada vez maiores e eu não fazia ideia da dimensão que aquilo representava.

     Consigo imaginar 10 caixas de laranjas com 50 laranjas dentro de cada, alias não sei se consigo realmente, agora eu desafio a qualquer um a tentar imaginar o quanto são 700 milhões de qualquer coisa, sem dúvida é uma tarefa que nos faz repensar os conceitos de ” Nada é impossível ‘‘ ou ” Só o céu é o limite ”.

     Todo esse pensamento me ocorreu na primeira ou segunda vez que passei pelo letreiro e resolvi dedicar dez minutos para aquele que seria o inicio dessa aventura. Lá pela quinta visita à Avenida Principal eu já estava acostumado a todos os números me encarando e certas vezes me sentia envergonhado ao ouvi-los dizer:

” — Olha todo esse dinheiro, pessoas trabalhando dia e noite para acumular toda essa verba, pobres coitados morrerão sem saber que um dia estavam vivos. ”

     Mal sabiam os números que haviam acabado de me dizer quem era o culpado pelas pobres almas que estão enriquecendo Caronte no passar dos anos, o dinheiro.

     Imerso em Delírios cotidianos eu já havia imaginado de tudo, desde um mundo dominado por formigas canibais africanas até um Universo calmo, distante e alheio a tudo que tinha como principal característica o silêncio da ausência humana, mas eu estava agora diante da mais difícil tarefa da minha vida: Como seria o mundo hoje sem dinheiro?

     “This is it “ diria o pequeno Michael, somos imediatamente tomados por uma nostalgia ao fazer essa pergunta e levados a uma tribo de Índios pacifica onde a caça e coleta de frutos são o que nos manteriam vivos ou o mais otimista chegaria a imaginar uma sociedade feudal com vassalos e senhores se apoderando de tudo e todos, mas eu não, acredito que ainda teríamos tecnologia se é isso que tememos.

    Enquanto revoluções ocorriam na França, no Brasil, na Inglaterra, enfim ao redor do mundo, pessoas nesses mesmos lugares também estavam em casa sentadas e esperando por alguém que decidisse seu futuro, enquanto 10% lutava por uma sociedade mais justa, outros 90% decidiam se naquela noite comeriam cozidos ou assados. Por que com a tecnologia seria diferente?

    Será que Galileu deixaria de fazer suas observações astronômicas e iniciar o Método Cientifico caso ele não recebesse dinheiro em seu trabalho?  Será que agricultores continuariam a produzir em grande escala para alimentar pessoas que estariam naquele mesmo momento sentadas em casa engordando? Será que existiriam pessoas em casa engordando? Será que a cobiça está realmente intrínseca no comportamento humano, não seriamos capazes de ver pessoas se degladiando por poder enquanto entregávamos o novo carregamento de tomates sem cobrar 1 centavo àquele “comerciante” que era encarregado de distribuir a quantia pedida por quem quer que passasse por lá?

     Durante algum tempo eu tenho certeza que  poucas pessoas iriam continuar lutando para criar o análogo ao dinheiro, por simples ambição, mas vemos hoje um mundo onde poucos detém quantidades significantes de capital, ou seja, a esmagadora maioria da população participa desse Banco Imobiliário de tabela. Esses poucos no passado seriam apenas mortos? Ignorados? Não faço ideia, mas eu sinto uma certeza absoluta em que a maioria conseguiria se sobressair e mostrar a nós do século XXI como é que deveria ser feito.

     Apenas por diversão fui levado a acreditar em Universos Paralelos com cópias idênticas as nossas onde cada decisão que tomamos eles tomam uma ao contrário, ou similar ou nem chegam a fazer nada, seja em qual desses Universos o meu Mundo sem dinheiro se prosperou, eu daria qualquer coisa para passear por lá nem que seja por um único dia.

Talvez me deixem morar lá,

Mas só talvez….

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Como o que assim foi?

Assim começa mais um dia qualquer. A dificuldade de sempre mora na falta de objetividade. Muitas vezes eu queria fazer o que eu gosto por motivos próprios. Mas ate o que eu gosto e' fruto de uma cadeia de eventos que eu não tive muito controle.

Sera' que pensar na vida como algo sem significado, passageiro, curto e sem preocupacoes com o proximo não seria a melhor solução para mim?

Eu estou notando algumas mudanças de valores no meu meio social, eu consigo sentir que agora eu necessito ainda mais que as pessoas saibam o que eu faço. Eu preciso falar que eu escrevo textos, que eu estudo musica, que eu tiro fotos...

necessito que saibam aonde eu estive, que eu estou aproveitando meu tempo com algo divertido para eles, que eu devo explicações para todos a respeito do meu dia-a-dia.

Eu sinto que eu estou perdendo o foco dos meus objetivos, dos meus ideais e estou ficando cada vez mais proximo de algo fútil e banal para os meus padrões anteriores. Talvez esse local ainda seja o único refugio que eu tenho, onde eu não sinto a necessidade de me tornar publico.

Mas por que voce não escreve em uma folha de papel e guarda na sua gaveta como voce costumava fazer?

- Essa ja e' mais uma prova de que meus valores estao mudando. Existia internet, computador e todo o resto ha alguns anos atras e eu poderia ter me beneficiado muito mais da divulgação dos meus trabalhos naquela época do que agora. Mas por que? agora caso eu não esteja escrevendo na internet, não e' a mesma coisa.

Eu odeio comentar meus textos. Caso voce leia, por favor, não comente-os comigo. Por favor. Eu não devo explicações pra ninguem nesse meu mundo criado e vivido as escondidas. Não quero obedecer regras gramaticais, literárias ou físicas. Quero conversar.

Qual o preço de uma boa conversa hoje em dia?
Com quem se conversa agora? E sobre o que? Nos informamos sobre as coisas... eu me entupo de noticias, me entupo de opiniões sobre elas, guardo-as na superfície mais acessível do meu HD cerebral e quando encontro outras pessoas, tento esvaziar tudo o que eu guardei.

Meus encontros se transformaram na definicao de lixeira virtual. Nao preciso mais desse arquivo sobre conflitos na Mongolia, entao vou lança-lo inteiro em voce, e quando me falarem sobre o assunto de novo eu vou lembrar...

"e'...aquilo la' na Mongolia...e' foda."

E', vou dormir.



segunda-feira, 21 de julho de 2014

Capitulo 1



E' dificil ser sincero em um mundo onde tudo e' motivo para rótulos e classificações. Eu não posso dizer o que penso, voce não pode dizer o que pensa, eu não posso deixar de me preocupar com sua condição de existência, e voce não pode me deixar em paz.

Eu nao posso falar eu te amo,
nao posso dizer o que desejo,
nao posso ter o que quero, não posso ser quem eu quero, não posso ter as minhas verdades,
meus objetivos, meus caminhos, meus sonhos, meus amores,
rancores, tristezas, alegrias, desinteresses e lampejos.

A verdade e' que depois de um tempo me alterando,
para encaixar-me nos mais diversos grupos de convívio, me peguei sem identidade.
Nao sei o que eu amo, o que eu desejo e pra quem quero.
Nao consigo muitas vezes decidir se saio de casa,
se fico em casa. Se sorrio, se choro ou se ignoro.

Penso que quando tenho que repensar tudo isso,
o poço esta' ficando mais fundo e estou mergulhando com tudo.
O Abismo... que saudade de voce algumas vezes meu colega.
No entanto eu ja' não converso com aquela Dona do salto alto,
que um dia me veio visitar e em uma branda conversa me deu opções:
escolha entre ti e o que te confunde.
escolha entre ti e o que te parece artificial,
escolha entre ti e a dor do desentendimento,
da ma' impressão, da solidão das noites cheias e barulhentas,
das palavras vazias, dos sorrisos forçados, da escravidão social.

Fiz minha melhor escolha e re-aprendi.
Hoje talvez eu veja sob uma ótica diferente e confesso que eu poderia ter feito melhor,
poderia enganar melhor a mim mesmo, poderia ter pedido desculpas,
poderia ter sido compreensível, eu poderia ter sido muita coisa.

Mas nao fiz, talvez por orgulho. Talvez por falta de coragem,
ou por que voce não deixou.
Eu queria ter de tudo, mas vivem me mostrando que eu não tenho nada.
Se torna complicado buscar significados,
quando voce cresce sendo desconstruido,
alheio ao ambiente.

O ultimo sobrevivente da guerra contra desejos inalcançaveis.

Nao posso me dar o luxo de complicar demais meus pensamentos,
eles me consomem de uma maneira que voce não entende.
Eu sinto que nao posso guarda-los.
Tenho que de certa forma dizer.
Nao existe luta pior do que aquela em que para derrubar o inimigo,
voce e' obrigado a se machucar.
Esses sou eu.
Sou muitos. E nao quero nenhum deles ferido.
Mas voce ja' imaginou como e' lutar contra voce?
como e' chorar ao anoitecer por algo que não fez? Ou fez, mas foi um desses.
Voce sabe que voce não e' assim, mas foi voce quem fez. Ou não foi?
por uma memoria de quase 18 anos?
por um pedido de desculpas?
por uma briga que ocorreu ha 15 anos, mas cada detalhe permanece na sua cabeça,
por um choro alheio que te comoveu?
por um ato de bravura que distorceu todo o seu trajeto?
por ter que abandonar amigos?
por ter sido julgado e condenado sem nunca saber do direito de se mover. E viver.
Livre.